O Consórcio Guaicurus tomou a decisão de apelar ao Supremo Tribunal Federal (STF) após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negar um recurso que buscava contestar a legitimidade da Associação Pátria Brasil na movimentação de uma ação de indenização de R$ 500 milhões. Essa ação é resultado da insatisfação da população com os serviços de transporte coletivo geridos pelo consórcio em Campo Grande. Desde que foi protocolada, em 2020, o processo tem se arrastado sem uma sentença definitiva, levando a uma crescente frustração tanto entre os usuários do serviço quanto entre os representantes da associação.
A situação foi amplamente discutida no âmbito jurídico e destaca a complexidade dos processos envolvendo concessionárias de serviço público. O recurso do Consórcio Guaicurus ao STF introduzirá um novo capítulo neste dilema legal, uma vez que novas deliberações estão prestes a se desenrolar na Suprema Corte. A alegação do consórcio gira em torno da suposta violação de direitos constitucionais pela associação, que, segundo eles, não teria a legitimidade necessária para mover essa ação civil pública.
No entanto, especialistas do direito são céticos quanto à possibilidade de sucesso desse recurso. Eles apontam que a 1ª Turma do STJ já havia se manifestado de maneira unânime em sua decisão anterior, com cinco ministros votando contra o Consórcio Guaicurus. A relatora do caso, a ministra Regina Helena Costa, enfatizou que os argumentos apresentados pelo consórcio eram insuficientes para derrubar a decisão do tribunal de origem — em que o TJMS reconheceu a legitimidade da Associação Pátria Brasil.
Os ministros que votaram para manter a ação contra o consórcio incluem nomes proeminentes da justiça brasileira, como Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina e Gurgel de Faria. Enquanto isso, a tentativa de contato da reportagem com o Consórcio Guaicurus para obter um posicionamento sobre o caso não obteve resposta, e o espaço permanece aberto para possíveis declarações futuras.
Central ao argumento da Associação Pátria Brasil é a relação de consumo, onde apontam que os empresários do transporte coletivo devem reembolsar a sociedade pela insatisfação gerada pela má qualidade do serviço prestado. Cabe ainda destacar que o Consórcio Guaicurus opera com um contrato estimado em R$ 3,4 bilhões e ainda gera uma receita adicional por meio de publicidade em seus ônibus, totalizando cerca de R$ 324 mil anualmente.
Outro aspecto levantado pela ação são as discrepâncias nos cálculos que formam as tarifas do transporte. A possibilidade de enriquecimento ilícito é uma acusação que permeia a discussão, uma vez que a associação anexou um laudo técnico que revela como detalhes importantes foram omitidos em planilhas apresentadas pelo consórcio, resultando em tarifas superfaturadas. Ademais, a frota utilizada apresenta um histórico de ônibus antigos, no qual o consórcio estaria descumprindo as cláusulas de seu contrato ao operar veículos com idades superiores ao que fora estipulado, resultando em prejuízos diretos para os passageiros.
À medida que o processo avança, a contestação da legitimidade da associação pelo Consórcio Guaicurus é um ponto sensível que poderia impactar significativamente o futuro do caso. A decisão pendente do STJ não apenas definirá o destino da indenização como também poderá alterar a dinâmica dos serviços de transporte em Campo Grande.
Apesar de receber aplicações de multa na ordem de R$ 12,2 milhões por descumprimimento de cláusulas contratuais, o Consórcio Guaicurus manteve uma receita robusta de R$ 1.277.051.828,21, acumulada entre 2012 e 2019, contabilizando os primeiros oito anos de seu contrato. Os dados fornecidos pela Agereg (Agência de Regulação dos Serviços Públicos Delegados de Campo Grande) revelam um crescimento constante nos lucros do consórcio, que permaneceu linear entre os anos de 2016 e 2018, apresentando lucros mesmos em 2019.
A saúde financeira do Consórcio Guaicurus é notória, evidenciada pelo triplo aumento em seu patrimônio líquido, que passou de R$ 17,3 milhões para R$ 55,9 milhões durante o mesmo período. Mesmo com lucros consistentes, as empresas que operam no setor de transporte público em Campo Grande gozam da isenção do pagamento do ISS (Imposto Sobre Serviços), o que se traduziu em uma previsão de renúncia fiscal que pode chegar a R$ 31,7 milhões nos próximos três anos. O desenrolar desse caso continua a ser monitorado de perto, à medida que os desdobramentos judiciais prometem repercussões para o futuro do transporte público na cidade e para os direitos dos cidadãos.