Na noite de 24 de janeiro de 2025, Brasília se despediu do poeta Vicente Sá, que faleceu aos 68 anos, deixando um legado literário e cultural profundo. O poeta Nicholas Behr, ao se referir a Sá, declarou: “A morte é para os outros, não para os poetas”. Essa frase encapsula a essência da obra de Vicente, que transcende a finitude da vida e alcança a imortalidade através de seus versos.
Nascido Vicente Tadeu Maranhão Gomes de Sá em Pedreiras, no Maranhão, Vicente não era apenas um poeta; ele era um compositor, cronista, romancista, roteirista e jornalista que dedicou sua vida à arte e à cultura. Após se estabelecer na capital federal, Vicente não só fez de Brasília sua casa, mas também a narradora de suas histórias e inspirações, especialmente em bairros como a Asa Norte, que se tornaram parte de sua poesia.
A relevância de Vicente no cenário cultural de Brasília é inegável. Ele foi parte de uma geração que “humanizou a maquete”, como Behr descreve, contribuindo para moldar o Plano Piloto, projetado por Lúcio Costa e adornado por Oscar Niemayer. Esse ambiente propício à criatividade deu vida ao primeiro movimento cultural genuíno da cidade nos anos 1970, marcando o início de uma era que valorizava a expressão artística em um contexto de repressão política.
O maestro Renio Quintas, íntimo colaborador de Vicente, relembra como sua arte floresceu durante os “tempos de resistência”, em um período em que a ditadura cívico-militar (1964-1985) impunha censura e silenciamento. No entanto, apesar das dificuldades, os artistas encontraram maneiras de se unirem e darem voz às suas inquietações. “Naquele lugar, foi possível ter encontros que não aconteceriam em outros locais”, destaca Quintas, lembrando como Vicente e outros artistas começaram a ocupar espaços de expressão, como teatros e museus, essenciais para a formação da identidade cultural da cidade.
Sérgio Duboc, que foi parceiro musical de Vicente Sá por mais de quatro décadas, expressou sua tristeza pela perda. “Nos acostumamos a compor juntos”, disse Duboc, que ressaltou a criatividade única entre os dois. “Às vezes, eu trazia uma música pronta, e ele transformava em algo ainda mais belo com suas letras.” Essa dinâmica criativa era espontânea e repleta de troca, mostrando como a colaboração artística pode dar origem a obras memoráveis.
A comunidade poética de Brasília se volta para as redes sociais, onde amigos e admiradores compartilham os versos de Vicente, perpetuando sua memória. Frases como “Quero morrer assim/ cercado de amigos e cachaça/ no colo da eterna companheira/ bonito/ poeta.” são relembradas como reflexos da alegria e do espírito livre que marcaram sua produção literária.
Vicente Sá faleceu devido a complicações de pneumonia, agravadas pelo tratamento contra o câncer, mas sua homenagem será feita no Espaço Cultural Renato Russo no dia 26 de janeiro, a partir das 10h. A celebração de sua vida e obra contará com a presença de poetas e músicos, que se reunirão para honrar aquele que tanto contribuiu à cena cultural brasileira.
A perda de Vicente Sá é profunda, não apenas para Brasília, mas para todos aqueles que valorizam a arte e a literatura. Seu legado, no entanto, permanece vivo, não só em suas obras publicadas, mas também nas memórias e nos corações daqueles que tiveram a sorte de conhecer sua genialidade criativa. Com sua morte, a poesia brasileira perde um de seus grandes representantes, mas seus versos continuarão a ecoar, mostrando que, de fato, a morte não é o fim, e que, para o poeta, sempre há uma forma de renascer através da arte.